sábado

Conto: O Sapo Sonhador, de Cleuza Sarzêdas


O Sapo Sonhador
de Cleuza Sarzêdas


Na beira de um pequeno lago em um terreno baldio, um sapo vivia. Ele era diferente de todos os outros: sua pele lisa tinha um prateado claro, com listras marrons. No alto da cabeça, um desenho dourado semelhante a uma coroa. Seus olhos eram da cor do céu. Sonhava ser rei daquele lugar, comandar com muito amor seus irmãos e irmãs e protege-los dos animais malvados e dos humanos que ali chegavam para caçar as rãs. Irresponsáveis, muitos nem sabiam a diferença entre uma rã e um sapo, matando-os até descobrirem o que queriam. Seria um paraíso! Cada morador teria o próprio nome, e iria à escola para aprender a ler e saber a razão de ter nascido e qual a participação de cada um no mundo. Teria casa, trabalho e família. Os adultos trabalhariam para os menores e todos seriam respeitados.

Ele, como rei, casaria com sua namorada, uma linda sapinha de grandes olhos negros, que seria a rainha. Teriam muitos filhos e formariam uma grande família abençoada por Deus.

Naquele momento, uma claridade cobriu o lago e o sapo sonhador viu-se sentado num trono com enorme coroa sobre a cabeça. O terreno e o lago eram o seu reino e a sapinha de olhos negros transformara-se em sua esposa. A população, composta de anfíbios e répteis, era muito feliz, vivia cantando. Ali morava a felicidade! Mas os súditos percebiam uma tristeza no rei e comentavam que a rainha não queria filhos, pois alegava darem muito trabalho e ela dizia não ter tempo para cuidar deles.

O rei, tranqüilo e paciente, tentava convencê-la de que os filhos são o futuro da nação e que onde não há pequeninos falta alegria. O sapo argumentava: “Quando formos bem velhos, o que faremos se não tivermos netos para contar histórias de sapos? E o reinado ficará nas mãos de quem quando Deus nos chamar para junto dele? Fomos criados para aprender muitas coisas e para procriar, dando oportunidade a outros sapos de viverem o que nos vivemos. Eles serão o que nós fomos e muito mais, farão mais do que fizemos. Tudo é uma questão de evolução.”

Mas a rainha, orgulhosa e vaidosa, não queria ouvir o que o marido dizia e continuava teimosamente não querendo filhos. Decepcionado, o rei foi chorar à beira do lago quando, súbito, teve a atenção despertada para algo que se movimentava muito rapidamente de um lado a outro até que finalmente parou: era um girino.

Girino é filho de sapa com sapo, nasce de um ovo dentro d’água, respira por brânquias, ou seja, guelras, é semelhante a uma bolinha preta com um rabinho. Esse rabinho cai quando ele se torna um sapo adulto e vai morar em terra firme. O pequenino colocou a cabecinha fora d’água e falou:

“Senhor rei, vivo triste neste lago porque não tenho ninguém. Meus pais na terra foram morar e eu aqui fiquei. Nem irmão tenho para brincar. O senhor não quer ser meu pai? Juro ser obediente, estudar bastante, me alimentar o suficiente para crescer e ser bem sadio e nutrido. E, quando adulto, fazer de você um vovô bastante feliz. Palavra de girino.”

O rei sorriu comovido e se encantou com aquele ser tão inteligente. “Vou adotar você. A partir de hoje será meu filho querido e se chamará Girinino. Sempre que puder virei conversar com você, até tornar-se adulto e ao meu lado governar. Quando eu me for, você será o novo rei.”

Feliz, o girino balançava eufórico o minúsculo rabinho e cantava: “Agora tenho um pai… agora tenho um pai… nunca mais ficarei só…”

A partir daquele dia, o rei, alegre, passou a ser visto junto do lago a conversar com o filho amado. Os dois brincavam e se divertiam por horas e horas.
Mas a rainha, enciumada com medo de perder o reinado, mandou pescar o girino e o colocou no mato, dentro de uma concha somente com água, na intenção de matá-lo de fome. Agindo daquela maneira, achava que iria livrar-se do que pensava ser uma ameaça para ela. Preocupado com o sumiço de Girinino, o rei chamou a guarda e ordenou:

“Vasculhem todo o lago e encontrem meu filho.” Inútil a procura. Não o encontraram. Mas, na esperança de achar seu querido pequenino, o rei voltava ao lago todos os dias e punha-se a chamar: “Cadê você, filho adorado? Apareça!”

Os dias passaram e o rei voltou a ficar triste. Ele contornava o lago por várias e várias vezes à procura de Girinino. A saudade apertou tanto que ele adoeceu e foi chorar junto a um matagal próximo. Lá, já sem esperanças, debruçou-se sobre uma pequena concha como se fosse uma mesinha e, de repente, ouviu uma voz bem fraquinha.

“Paizinho, vem me buscar”. O rei olhou em volta, assustado, mas nada viu. Procurou entre as folhas, revirou tudo e nada achou. Decidiu voltar para casa, mais triste ainda. No entanto, no momento em que se afastava, novamente ouviu a voz, quase sumindo: “Paizinho, vem me buscar”.

Teve, então, certeza de que era seu filho. Ele estava preso ali, em algum lugar. Desesperado, o rei recomeçou a busca e encontrou a conchinha. Abriu-a e deparou-se com o pobre girino quase morto de fome. Levou-o rapidamente para o lago e conseguiu salvá-lo.

Chamou sua guarda pessoal e ordenou que não o deixassem só nunca mais. Em seguida, decidiu punir o malvado e perguntou a Girinino quem lhe fizera aquilo.

Mas o sapinho tinha bons sentimentos e não acusava ninguém, pois sabia do amor que o rei sentia pela rainha. Mentiu para que seu paizinho querido não sofresse: “Um sapo malvado me enganou dizendo-me que o Rei me chamava. Fui atrás dele e o bandido me trancou naquela concha. Para não morrer de fome comi os mosquitos que entravam pela abertura, pois tinha certeza que você me encontraria.” “Agora, filho, ficaremos juntos para sempre. Ninguém nunca mais tocará em você.” Abraçaram-se fortemente.

Ainda com os bracinhos apertando o próprio peito, o sapo ouviu a voz da sua amada, a sapinha dos grandes olhos negros, de dentro do lago: “Vetusto! Acorda, seus filhos nasceram. Veja! são muitos.” Sonolento e sob a ação do sonho, o sapo abriu os olhos devagar e viu muitos girinos nadando rapidamente de um lado a outro. Feliz, jogou-se ao lago entre os tantos filhos e cantou.

“Agora sim, sou um verdadeiro rei…”.


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